quarta-feira, 4 de maio de 2011

A dor de uma saudade (*)

 Por Ivone Rodrigues

“Senti na pele a dor e a perda, pois fazem 9 anos que
sinto esta dor.
Meu filho tinha só 18 anos, quando em uma 6ª feira
foi buscar sua namorada no serviço, quando foi abordado
por 3 bandidos. Eles lhe pediram a chave do carro, ele
entregou, mas os bandidos não conseguiram ligar o carro.
Dispararam, então, 6 tiros, sendo que 3 pegaram no meu
filho, que morreu na hora.
Hoje estou muito triste, nem sei e nem tenho forças
para descrever; só sei dizer que a dor é tão grande que às vezes
eu acho que não vou suportar. Tomo remédio pra dormir.
Voltei a estudar. Um dia, na escola, eu passei mal;
foi quando conheci uma mulher que é filha da zeladora da
escola e ela me falou do Cravi. Eu aceitei e estou participando.
Não estou bem, mas pelo menos conheci várias pessoas que
passaram pela mesma violência que eu.”

A VIOLÊNCIA
“Hoje em dia a violência no Brasil é uma
coisa triste. Eu posso falar, pois sofri e sofro até
hoje as conseqüências da violência.
Faz 8 anos que mataram meu filho. Ele
tinha só 18 anos e 3 bandidos pediram-lhe a
chave do carro; ele entregou, mas eles não
ficaram contentes e deram-lhe 6 tiros. Ele morreu
e isto me deixou muito triste.
Hoje, não tenho como descrever o quanto
meu coração dói. Só com a força de Deus eu
tenho conseguido não viver, mas sobreviver.
Muitas vezes eu desejei que o tiro fosse no meu
coração e não no dele.
Tomo remédio para dormir e voltei a
estudar, mas não consegui melhorar. Me dava
muitas crises, inclusive soluços, crises forte de
choro.
Até que um dia eu estava na escola onde
estudo e onde meu filho, André estudou; na
secretaria encontraram uma foto de André e eu
chorei muito. Então a filha da zeladora perguntou
para alguém porque eu estava chorando e falaram
o porquê. Como ela trabalha no Cravi, ela me
ofereceu ajuda, e eu falei que sim. Ela pegou meu
nome, e dias depois, ligaram para mim.
Comecei passando, conversando com
uma assistente social e uma psicóloga. Elas são
muito legais.
Hoje faço parte de um grupo de cidadania,
estou conseguindo uma pouca melhora, mas a
Ivone dor não passa e a saudade também não.”


(*) Relato publicado originalmente no livro "Quebrando o silêncio: memória, cidadania e justiça", p. 23-24, 2008, CRAVI, SP